Opinião & Análise A ideia de uma “cara-metade” pode ser perigosa Por admin-sn Há 1 ano Criado por admin-sn Há 1 ano 1,2K Visualizações Compartilhar 0FacebookTwitterPinterestEmail 1,2K Rute Agulhas* É FREQUENTE ouvir-se dizer que uma determinada pessoa “é a minha cara-metade”, que é como quem diz, “alguém que me completa e me faz feliz”. Falamos de uma ideia romântica de duas metades que encaixam. Será esta ideia, em si mesma, perigosa, na medida em que traduz a crença de que, sem uma relação amorosa, a pessoa existe pela metade? Somos seres incompletos quando não temos uma relação de namoro, união de facto ou casamento? A ideia de uma “cara-metade” carrega consigo a sensação de se existir pela metade, como se de algo muito negativo se tratasse. Como se quem está sozinho (leia-se, sem manter uma relação amorosa estável) fosse inferior e se sentisse necessariamente mais triste e infeliz. Sabemos que uma relação amorosa gratificante (e sublinho a bold o adjectivo de forma intencional, pois não basta manter uma relação – é preciso que esta se revista de características positivas, como o respeito, a intimidade, a capacidade de escuta, a tolerância e a flexibilidade) aumenta a sensação de bem-estar e potencia emoções agradáveis. Os casais que se sentem felizes na sua relação de conjugalidade tendem também a expressar maior satisfação em outras áreas da sua vida, como se existisse um efeito de contaminação positiva. Isto é inquestionável e muito benéfico para o seu bem-estar psicológico. O que pode ser preocupante é a ideia de que, sem este tipo de relação afectiva, e tantas vezes por opção – sim, as pessoas têm o direito a escolher não manter uma relação amorosa -, se é forçosamente mais infeliz. Quase merecedor de sentimentos de pena por parte das outras pessoas… “coitado, está sozinho”; “já viste há quanto tempo não tem ninguém?”. É neste contexto que se reveste de especial importância reflectir sobre a noção de autoconceito e auto-estima. O autoconceito é uma imagem compósita de: a) o que pensamos que somos; b) o que pensamos que conseguimos alcançar; c) o que pensamos que os outros pensam de nós, e d) o que gostaríamos de ser. Por seu turno, a auto-estima relaciona-se com a avaliação pessoal do nosso autoconceito – diz respeito ao grau relativo de valor ou aceitação que as pessoas consideram que o seu autoconceito tem. Olhando para as estas dimensões do autoconceito, percebemos que alguém que acredita nesta ideia da “cara-metade” e que não tenha uma relação de conjugalidade gratificante facilmente poderá ser levado a pensar que: a) “não existo de uma forma plena e completa”; b) “o que tem impacto negativo nas minhas conquistas e aspirações”, e c) “os outros vêem-me como inferior e inacabado”. Quem pensa assim, vive em constante perseguição da outra metade, de maneira a sentir-se inteiro, avaliando o seu autoconceito, necessariamente, de uma forma mais negativa. Diria que esta forma de pensar é efectivamente perigosa, desviando-nos do cerne – gostarmos de nós mesmos, pelo que somos, e não pelo que temos ou por quem temos ao nosso lado. Manter uma relação amorosa satisfatória e recompensadora é muito importante e tem um impacto positivo na forma como a pessoa se sente e interage, mesmo noutras esferas da sua vida. É algo que acrescenta, mas que não deve ser entendido como o preenchimento de algo que está vazio e inacabado. *Psicóloga clínica e forense, terapeuta familiar e de casal Leia mais… Você pode gostar também Adopção: será que é um negócio? REFLEXÕES DA MUVALINDA: Eleições Cá da Terra: A primeira impressão (2) Nem tudo está sempre bem: como não cair na armadilha da positividade tóxica Opinião & Análise Compartilhar 0 FacebookTwitterPinterestEmail Artigo anterior Quarenta e um bebés nascidos com malformação congénita Próxima artigo REFLEXÕES DA MUVALINDA: Burnout Artigos que também podes gostar BELAS MEMÓRIAS: Fragilidades! Há 2 dias CÁ DA TERRA: Uma bonança bem antecipada Há 2 dias REFLEXÕES DA MUVALINDA: Direitos humanos Há 5 dias Vamos parar com isto… Há 1 semana BELAS MEMÓRIAS: Como regressarei à casa? Há 1 semana CÁ DA TERRA: Morrer à fome ou de doenças Há 1 semana