Segunda-feira, 16 Setembro, 2024
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DIGNIDADE E DIREITOS (178): Responsabilidades parentais, abandono afectivo da criança e a dignidade           

Por Jornal Notícias
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EPISÓDIO social: após a separação dos pais, a criança foi entregue a um membro familiar para dar cobro ao acompanhamento do seu processo educativo. Na essência da história, os progenitores, separados de facto depois de uma curta convivência matrimonial, decidiram seguir caminhos de continuidade profissional distantes do país.

Hoje, volvidos alguns anos, observa-se que a ainda criança abandonou a escola, refugiando-se na residência de um outro familiar do lado paterno e dedica-se a pequenos negócios como vendedora ambulante, notando-se, sorrateiramente, a sua inclinação ao consumo de bebidas alcoólicas e outros vícios desajustados ao seu desejável e harmonioso crescimento.

As famílias dos dois lados da descendência da criança (materno-paterno) digladiam-se em mútuas acusações pelo desmoronar progressivo do petiz, numa altura em que os progenitores se ausentaram há longos anos e indiferentes para com a situação.

A questão de debate orienta-nos a avaliar até que medida o acordo sufragado pelos pais, de entrega da criança à família, se enquadra nos parâmetros de salvaguarda do superior interesse da criança(?)

Discutindo     

A responsabilidade parental traduz-se num direito-dever dos pais para com os filhos, servindo de suporte legal para a efectivação dos direitos fundamentais. O cumprimento de deveres parentais não pode ser uma opção dos pais antes, pelo contrário, um imperativo legal passível de responsabilização adequada em caso de incumprimento.

Na arrumação hierárquica da avaliação do quadro normativo sobre a protecção dos direitos da criança, a Constituição da República estabelece no artigo 47 o imperativo da observância do interesse superior da criança como condição inegociável.

Na banda processual sobre a matéria, a colocação da criança num ambiente educativo fora dos pais deveria ter seguido um curso de obediência ao espírito do comando constitucional referido, ou seja, filtrado à Lei da Família e demais legislação aplicável.

Com efeito, os artigos 293 e seguintes da Lei da Família desenvolvem a figura de poder parental como ferramenta através da qual se incumbe aos pais o dever de garantir a protecção, saúde, segurança e sustento da criança durante a sua menoridade, podendo estender-se a responsabilidade na medida do que se mostrar razoável e pelo período de tempo requerido para que seja completada a formação do filho.

A separação dos pais implica imperativamente a apresentação de um acordo sobre o exercício do poder parental num prazo de dez dias e que deve sujeitar-se a homologação judicial (conferindo o artigo 322 da lei citada).

Não tendo sido a separação decretada pelo tribunal ou conservatória do registo civil, fica, certamente, difícil o controlo social da lei.

A Lei da Promoção e Protecção dos Direitos da criança regula no artigo 35 que a violação do dever de sustento ou o abandono da criança é punido nos termos da lei. Esta mesma lei indica, no artigo 48, que todo o cidadão e as instituições em geral têm o dever de prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança.

Como se repara e em conclusão, o quadro legal protector dos direitos da criança é abundante, mas a efectivação em situações concretas, na vida prática, está capturada pela indiferença individual e colectiva.

A eficácia social das leis não dependerá das instituições, sendo crucial a atitude do próprio sujeito, a pessoa humana. A conformidade legal deve engendrar-se cultura, reflectindo o sentido mais inestimável das relações sociais: respeito e consideração aos semelhantes, cada vez mais ausente!

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