Opinião & Análise CÁ DA TERRA: Nervos em ebulição Por Jornal Notícias Há 2 meses Criado por Jornal Notícias Há 2 meses 1,5K Visualizações Compartilhar 0FacebookTwitterPinterestEmail 1,5K Ontem foi um daqueles dias de calor intenso na capital do país. Literalmente não deu para pensar. Os nervos pareciam em ebulição. Da cabeça jorravam torrentes de suor fazendo lembrar o vulcão quando expele lava ardente que pelo caminho tudo destrói. O calor de ontem teve o condão de destruir a minha vontade de escrever. Os meus neurónios não estavam a colaborar com o meu desejo de lavrar algumas linhas CÁDATERRA. Pior de tudo, na véspera descobri que um mal intencionado tirou-me a “Vuvuzela” com a qual sempre festejei os “dérbis” de cá e de acolá. Ontem havia um dérbi por festejar e os malandros, sabendo dos meus amores, preferiram tirar-me a minha arma da alegria, do sopro de felicidade. Mais ainda, nesta derradeira semana o chamamento volta a soar para aqueles que amam a sua terra para não se alhearem ao processo magno, aquele que vai deixar marcas nas nossas vidas nos próximos cinco anos. Acho que os malandros que me sacaram a “vuvuzela” adivinharam os meus pensamentos. Tiraram a minha vuvuzela vermelha para encarcerar a minha vontade de mais uma vez me juntar à festa, tal qual o faço quando há um dérbi, em que calha estar do lado dos mais fortes, dos vencedores. Mas é do quase inferno que falava. Hoje Tete vai experimentar a sua proximidade com o inferno. Aquilo ali vai ser para doer. Para torar ovo ao sol. É que 44 graus centígrados não é pouca coisa. É sempre difícil viver no quase inferno. Estes últimos dias foram bem férteis em episódios que fazem recordar a crónica em que fala de Chingodzi, que aos 42 graus de temperatura mais se parecia uma sucursal do inferno. Está a ficar claro que os tempos são outros e o aquecimento global não está a poupar, com alguns graus celsius acrescidos a cada ano. Chingodzi é um próspero bairro de expansão do outro lado do rio Zambeze que se supõe que tenha milhões de toneladas de carvão mineral no seu subsolo. Aqui a secura e o calor são, em algumas épocas do ano, o pão nosso de cada dia, deixando quase em chamas o chão tórrido e poeirento. Já passam dois, três meses sem chuva significativa, salvo algumas raras excepções. Dificilmente vemos nuvem gotejando esperança. São nove horas, mas pelo calor parece até que é meio-dia. Há gente que anda por cinco minutos e já está a derreter. As mulheres sofrem com a maquiagem borrada, porque não adianta, não há produto que resista. Os ambulantes estão por aí oferendo “gelo” doce derretido que nem basta para refrescar a garganta. No “Chapa 100” o lugar mais desejado é junto à janela, apesar de tal nem fazer tanta diferença assim. Calor com cara de vingança, é isto aqui. É como fogo vindo das profundezas. Como se o carvão estivesse em brasa e ninguém sabe ao certo porquê. Se alguém tinha alguma dúvida, o calor do inferno já cá está. Instalou-se com vagas de temperatura impressionante, onde nem a sombra nos pode valer. O sol aqui se excede em alguns momentos. É difícil aguentar o calor do sol directo, sem nuvens, morrer fulminado por uma rajada que atravessa o solo e atinge a camada de carvão. O tronco das árvores seca, racha, cicatriza. As plantas ficam sem movimento. O vento seco espalha o calor desestimulando qualquer verde. É nessa fornalha viva, assim mesmo, que os homens como Matenga trabalham. Erguem paredes, misturam massa, soldam aço, derretem asfalto, britam pedra, varrem ruas, capinam o chão e cavam a terra para lançar a semente logo que as primeiras gotas de chuva caírem. Matenga não está nem aí para o sofrimento dos outros, senão o tijolo nunca mais queima. Por entre o amassar o barro, formatá-lo e finalmente atirá-lo ao forno, produz em si mais calor que nem as gotas de suor são suficientes para contabilizá-lo. Mas está ali, firme a cicatrizar a sua pobreza, a queimar o carvão nesta sucursal do inferno. É dos poucos homens que faz justiça aos que ali nasceram. Ao invés de migrar, preferiu explorar os recursos da terra para fazer riqueza, para agigantar mais a cidade sobre o carvão. São mais de oito horas por dia quase metade passada sobre o sol escaldante. Lida com a pá, com o ponteiro e marreta, ou mete carvão nos fornos que na hora do sol forte tiram fogo, literalmente. O calor, por ora, parece irrelevante. Ele gosta de assistir a tempestade chegar ao fim do dia e o sol quando se põe, anunciando uma nova fornalha para o dia seguinte. O brilho dos raios sobre as nuvens emprestam um espectáculo de fogo que se esforça por não perder. Meia hora depois o sol finalmente se despede, deixando para trás a brasa ainda acesa. É impossível resistir a este quase inferno. Dá preguiça, mata-nos lentamente só de pensar em ter que enfrentar mais um dia neste excesso de calor com cara de vingança. Leia mais… Você pode gostar também REFLEXÕES DA MUVALINDA: Solidão criativa e vida académica solitária Comunicação não é o que dizemos, é o que os outros percebem do que dizemos ELEIÇÕES EUROPEIAS: Mais de 361 milhões chamados às urnas REFLEXÕES DA MUVALINDA: Sobre a Paz CÁ DA TERRANervos em ebulição Compartilhar 0 FacebookTwitterPinterestEmail Artigo anterior DEVIDO À GUERRA: Sudanesas sofrem abusos “inimagináveis” Próxima artigo Sobe despesa com reclusos Artigos que também podes gostar BELAS MEMÓRIAS: O ovo não se parte, pai! (3) Há 7 horas CÁ DA TERRA: Não há lugar para a descrença Há 7 horas Rússia e África: Passado e futuro da amizade (Concl.) Há 3 dias Rússia e África: Passado e futuro da amizade (1) Há 3 dias REFLEXÕES DA MUVALINDA: E se der certo?! 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