Opinião & Análise BELAS MEMÓRIAS: Forçado a regressar à casa Por Jornal Notícias Há 10 horas Criado por Jornal Notícias Há 10 horas 293 Visualizações Compartilhar 0FacebookTwitterPinterestEmail 293 QUANDO tudo indicava que Manuel, um menino dos tantos sugados pela emigração clandestina para a África do Sul, não mais se enquadraria na terra que o viu nascer, eis que um “vendaval avassalador” se abate sobre ele. Embora não tivesse muita ligação com o solo pátrio, mantinha contacto com alguns familiares, parte dos quais a trabalhar também no país conhecido como “terra do rand” (África do Sul). Ele não tinha identificação, clandestino que era, mas no seu primeiro emprego acabou por ter. -De que forma isso aconteceu? – Meu patrão de quando em vez dava-nos a liberdade de passearmos pela área e com um pouco de azar cruzávamos com agentes da Polícia e alguns eram presos. Por ver o seu efectivo a reduzir, com implicações no processo de produção, ele sentiu-se obrigado a tratar a documentação para todos, mas os passaportes permaneciam com ele. – Que importância isso tinha, se na mesma vocês poderiam ser presos? – Depois da prisão, ele encarregava-se de ir apresentar os passaportes e éramos postos em liberdade. A guarda dos documentos era mesmo para salvaguardar os seus interesses, porque uma vez na nossa posse, facilmente poderíamos fazer aventuras em busca de outras oportunidades. Os que tinham familiares em zonas como Maputo, eram autorizados a sair às sexta-feiras e regressar aos domingos para fazer o movimento migratório. Mesmo assim, ninguém saia incondicionalmente. A saída era mediante o depósito de 50 rands que só eram recuperados mediante a devolução do passaporte. – era como se fôssemos ainda indocumentados para o bem dos interesses do nosso patrão. – Como ficou fora deste controlo cerrado? – muitos rios foram cruzados, minha irmã, que nem sei de onde começar ou como resumir a minha história. Tu precisarias de muito tempo para me ouvires, mas vamos por partes. Em concertação com os companheiros da labuta, decidi sair uma dessas vezes para movimentar o passaporte. Uma vez fora, a ideia foi esquecer aquele dinheiro e tentar novas oportunidades, justamente o que o meu patrão pretendia evitar ao ficar na guarda dos nossos documentos. Manuel contava a sua história pausadamente, ao mesmo tempo que mostrava a amargura que sentia desse momento. Ao recuar no tempo parecia estar a viver o momento. Um tio seu, que não estava a fim de ir à Maputo passar as festas, propôs que o recebesse no “Mokhuku house” onde vivia de aluguer, para juntos passarem as festas. Manuel convidou alguns amigos moçambicanos e juntaram-se para a confraternização. A forma de celebrar a transição do ano varia de pessoas e de culturas. Enquanto uns vêm a beleza do fogo de artifício no ar como simbolismo, outros ateiam fogo em pneus à moda das manifestações cá entre nós. Manuel preparou o seu pneu e gasolina para a hora derradeira e aguardou. Para o seu azar, o pneu rolou para quintal alheio e foi apanhado por uns jovens de etnia zulo que não quiseram o entregar e assim nascia uma peleja que naquele dia, só não custou vidas humanas porque o Todo Poderoso não o permitiu. Enquanto disputava-se o pneu, os amigos do Manuel comunicavam-se com ele na língua portuguesa, o que adensou ainda mais os ânimos dos nativos, ao se aperceber que se tratava de forasteiros: mais uma razão para não serem entregues o pneu de volta e envolvidos em cenas de pugilato. Houve até dentes fora do lugar. A peleja parecia ter fim, mas somente intervalos, pois de tempos em tempos os jovens de etnia zulo se reorganizavam e voltavam ao ataque. Já cansado de ser atacado, Manuel proferiu palavras de ameaça que infelizmente tiveram poder, afirmando que ele era da etnia changane e que o indivíduo que o provocou terminaria mal. Perante confrontos sucessivos, Manuel preferiu estar do outro lado da fronteira, para ter um pouco de sossego. Mas como o azar o perseguia, o jovem zulo com quem tinha relação de rivalidade, por conta de um pneu usado e queimado, envolveu-se numa outra rixa e terminou baleado mortalmente. Para seus familiares e amigos, aquela morte só podia ter a ver com o Manuel, o forasteiro que disse ser changane e que o indivíduo que o provocou terminaria mal.(…) Leia mais… Você pode gostar também CÁ DA TERRA: Morrer à fome ou de doenças REFLEXÕES DA MUVALINDA: Sair da zona de conforto Rússia e África: Passado e futuro da amizade (1) REFLEXÕES DA MUVALINDA: Coragem BELAS MEMÓRIASOpinião & Análise Compartilhar 0 FacebookTwitterPinterestEmail Artigo anterior CÁ DA TERRA: Resgatar os valores Próxima artigo Hoje é Dia Mundial de Luta contra cancro Artigos que também podes gostar CÁ DA TERRA: Resgatar os valores Há 10 horas REFLEXÕES DA MUVALINDA: Pai incógnito Há 4 dias Como ter conversas difíceis: Um guia para comunicação eficaz Há 4 dias Como lidar com a perda de um ente querido? (1) Há 2 semanas Como implementar o modelo de negócio da Disney na experiência do cliente Há 2 semanas REFLEXÕES DA MUVALINDA: Vamos trabalhar Há 3 semanas