Terça-feira, 18 Março, 2025
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MOSTRA “QUADRA PLÁSTICA”: Artistas dialogam com a história e o ambiente

Por Jornal Notícias
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LUCAS MUAGA

NÃO só de contas vivem os trabalhadores de uma instituição bancária. A prova está no Museu Banco de Moçambique, na cidade de Maputo, onde quatro funcionários decidiram trocar o escritório pela galeria. E assim nasceu a mostra colectiva de artes visuais “Quadra Plástica”.

Da autoria de Ernesto Maluleque, Felisberto Tlhemo, Lénio Ussivane e Fernando Machiana, a exposição  conta com a curadoria de Jorge Dias. Inaugurada na última quinta-feira, pode ser visitada até meados de Abril.

São no total 14 trabalhos que dialogam com temas como a resistência à dominação colonial, a construção de novas narrativas locais e o meio ambiente. “As obras reflectem o sentimento de pertença a um lugar, a identidade e estética moçambicanas que foram marcadas por anos de luta e transformação”, explicou o curador.

Fernando Machiana, por exemplo, utiliza as suas obras para retratar a vida cultural e identitária dos moçambicanos. Aborda temas do passado e do presente, sem ignorar o quotidiano rural.

Foca-se particularmente nas tradições da sua terra natal, o distrito de Marracuene, província de Maputo. Sublinha memórias da sua comunidade, indo ao encontro das suas raízes profundas.

No mesmo espírito de valorização da moçambicanidade, Famós (pseudónimo de Felisberto Tlhemo) propõe uma ponte entre as gerações de artistas nascidos antes e depois da independência, enquanto Lénio Ussivane e Maluleque exploram caminhos distintos nas suas abordagens artísticas.

“Maluleque, com a sua utilização do desenho como retrato da realidade, procura expressar as marcas identitárias locais”, destacou Jorge Dias.

O curador acrescentou que Ussivane, por seu turno, está mais preocupado com as questões ambientais e utiliza elementos como a cor, o texto, os logótipos e a montagem de materiais como o plástico e o metal.

“As suas obras denunciam o impacto das alterações climáticas e a deposição irresponsável de resíduos, criando um forte impacto visual que gera reflexão sobre o futuro do ambiente”, considerou.

Memória e identidade

OS quatro artistas evocam questões de identidade, memória e espírito de pertença. Cada um segue o seu caminho, mas todos partilham o mesmo desejo de recontar histórias que marcam a vida de uma sociedade em constante transformação.

Maluleque, com três das suas obras, trouxe à luz uma reflexão sobre a busca da identidade e as aspirações humanas. “Procuro muito retratar a dor da saudade”, contou, explicando que assim encontrou consolo, por exemplo, na memória da sua falecida irmã.

“Revivi momentos e celebrámos a vida”, comentou, destacando que as imagens expressam a perda e resistência do amor e da memória que permanecem. O apreciador é convidado a reflectir sobre como a dor e a saudade podem ser um fardo ou uma força impulsionadora da criatividade.

Por seu turno, Famós, com a sua série sobre a magestosa Malanga, trouxe à luz a história de um bairro da capital do país que foi transformado com a construção da ponte Maputo-KaTembe. Os moradores, lembrou-se, foram deslocados e os objectos deixados para trás tornaram-se testemunhas silenciosas desta mudança forçada.

“Decidi juntar e contar histórias”, disse, lembrando que as suas peças “exibem o peso do tempo e a perda de um espaço que já não existe da mesma forma”. A nostalgia e a crítica social entrelaçavam-se, convidando o apreciador a uma reflexão sobre os efeitos do progresso social.

Já Lénio Ussivane, com o seu olhar atento ao que é descartado e marginalizado, transforma tudo em arte. As suas obras ressignificam aquilo que a sociedade tende a negligenciar.

No entanto, também exibe o seu amor pelos livros. “Tenho uma ligação forte com a literatura”, contou, mostrando o quão essa paixão transparece na sua obra, que integra versos de autores como Rui Nogar, Rui de Noronha e Luís Patraquim.

Entretanto, na abertura da mostra, o governador do Banco de Moçambique, Rogério Zandamela, referiu que a mesma evidencia os talentos artísticos dos colaboradores daquela instituição.

“Esta iniciativa resulta de um convite feito a todos os trabalhadores do Banco de Moçambique, tanto os activos como os reformados, para que participassem com propostas de obras da sua autoria nas mais diversas modalidades de arte, como pintura, desenho, escultura, fotografia, cerâmica, instalação e outras técnicas das artes plásticas”, afirmou.

Segundo Zandamela, os 14 trabalhos artísticos apresentados, que ocupam a galeria de exposições temporária, visam incentivar a prática artística dentro da instituição, ao mesmo tempo que se celebra a beleza e criatividade dos colaboradores.

“A união das obras de arte dos trabalhadores do Banco visa não só celebrar as suas competências, mas também dar vida à arte dentro da nossa casa”, concluiu o governador.

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