Domingo, 30 Março, 2025
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“Cultura não se vende, defende-se”

Por Jornal Notícias
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AMÁVEL PINTO

TODO o ser humano tem um preço para o seu silêncio ou, pelo menos, é assim que nos querem fazer crer. Mas para onde vai esse silêncio, uma vez promovido e bem pago? Em troca de quê calamos a alma do povo?

As respostas não são óbvias, mas o resultado é visível: uma sociedade sem cultura activa, mergulhada num torpor de ignorância, cuidadosamente sincronizada com valores impostos, formatada para aceitar um sistema de evolução deficiente, facilmente manipulável por interesses externos.

Política? Não. Falemos da verdadeira força invisível e estruturante: a cultura. Sim, a cultura é a única arma que escreve a história de forma silenciosa e verdadeira. No entanto, quando mal orientada ou pior, manipulada, transforma-se numa ferramenta poderosa nas mãos do inimigo.

Mas afinal, quem é o inimigo? São os bajuladores de conveniência, oportunistas de ocasião,e traficantes de influência, que usam a cultura como um passaporte de prestígio, enquanto a delapidam por dentro.

Uma cultura sem alicerces é como uma árvore sem caule. Não nos sustenta, não nos representa. Perdemos, pouco a pouco, a capacidade de distinguir o que é genuinamente nosso, daquilo que nos é imposto como moderno, como avanço.

Nos escondemos atrás do termo “globalização”, como se ele nos libertasse quando, na verdade, nos uniformiza. E, ironicamente, essa globalização tem sentido único: a entrada.

A saída? Bem, a malta lá se desenrasca. Toca-se uns batuques, veste-se umas tangas e já está, nos tornamos exóticos ao olhar ocidental, objecto de desejo turístico e fétiche antropológico. Não será isso uma forma de turismo sexual travestido de intercâmbio cultural?

Ninguém tem o direito de calar a cultura. Muito menos usá-la para impor padrões de uma nova colonização disfarçada. O objectivo é claro: desviar a sociedade dos seus valores culturais incontornáveis, esses que não têm preço nem podem ser trocados por nenhuma nota impressa, seja ela decorada com o rosto do Tio Sam ou com promessas de progresso.

E a juventude? Será corajosa o suficiente para resistir? Ou bastam umas notas e um contrato promissor para que, de tanga, se ponham gravata?

A verdade é que muitos preferem o conforto do silêncio comprado à inquietude do grito consciente. Tento compreender este novo mundo, mas talvez seja apenas um extra terrestre num pântano de oportunidades obscuras e interesses dispersos. Talvez. Ou talvez ainda haja tempo para erguer a voz e dizer que cultura não se vende. Cultura defende-se.

E é urgente começar hoje.

Foto: Féling Capela

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