DestaquePolítica EFEMÉRIDE: Acordo de Roma foi assinado há 32 anos Por Isaías Muthimba Há 2 meses Criado por Isaías Muthimba Há 2 meses 1,1K Visualizações Compartilhar 0FacebookTwitterPinterestEmail 1,1K ISAÍAS MUTHIMBA “TRINTA e dois anos de paz” é o refrão da música que todos os moçambicanos cantam hoje ao celebrar aentrada de mais uma década, a quarta, depois que o país testemunhou o calar das armas, colocando ponto final a 16 anos de uma guerra que só ajudou a piorar a condição de pobreza e subdesenvolvimento em que o país já se encontrava. Um conflito que, em parte, foi responsável pelo incumprimento dos objectivos da “Década da Vitória”,decretada alguns anos depois da independência,designada: “80/90 Década da Vitória na Luta contra o Subdesenvolvimento”, uma ousadia que desafiava a todos os cidadãos a se envolverem no trabalho, cada um no seu sector de actividade. No dia 4 de Outubro de 1992 foi assinado, em Roma, Itália, o Acordo Geral de Paz (AGP) entre o Governo de Moçambique e a liderança da Renamo, com o objectivo de acabar com o conflito que opunha os dois lados, fazendo jus ao dito “a guerra começa sempre com qualquer tipo de armas, mas só pode terminar com o diálogo”. Coube a Joaquim Chissano, na qualidade de Presidente da República, e ao líder da Renamo, Afonso Dhlakama, sentarem-se à mesma mesa, na cidade italiana de Roma, para rubricarem o entendimento que viria a pôr fim a pouco mais de 16 anos de guerra de desestabilização, com consequências nefastas no tecido socioeconómico do país. Para falar do AGP é imperioso falar do mês de Setembro, pois congrega três datas muito importantes para Moçambique, que marcam o desencadeamento da luta contra o colonialismo e o início de uma caminhada em direcção à independência. No dia 25 de Setembro de 1964, fez há pouco 60 anos, foi desencadeada a insurreição geral armada que, dez anos depois, a 7 de Setembro de 1974, forçou aassinatura dos Acordos de Lusaka, o que permitiu que em menos de duas semanas, a 20 de Setembro de 1974, tomasse posse o Governo de Transição, com a responsabilidade de criar condições para a proclamação da independência de Moçambique, nove meses depois, no dia 25 de Junho de 1975. Entretanto, logo depois da independência, que significou a derrota do colonialismo português, o país começou a sofrer agressões militares do regime de Ian Smith, da Rodésia do Sul, hoje Zimbabwe, entre 1976 e 1977. Quase que no mesmo instante iniciaram as incursões armadas da Resistência Nacional de Moçambique (RENAMO), na altura denominada Movimento Livre, apoiado pelo então governo minoritário do “Apartheid”, que dominava na África do Sul, perturbando assim o desenvolvimento de uma nação que tinha menos de dois anos de existência. Perante os ataques deste grupo armado e a necessidade de se recompor o tecido social bastante devastado pela guerra, em 1980 o Conselho Cristão de Moçambique (CCM), que congregava 17 organizações religiosas protestantes, formou um “comité para a paz e reconciliação”, com carácter permanente, quer em situação de guerra ou não, e era dirigida por Dom Dinis Sengulane, bispo da Igreja Anglicana. Perante os ataques de Ian Smith, que dominava o Zimbabwe, e o apoio do “Apartheid” à RENAMO, que tinha no Malawi uma espécie de base logística, o Presidente Samora Machel chegou a dizer que enquanto houver países da África Austral não independentes Moçambique não se podia considerar independente, tendo o dever de continuar a apoiar a luta desses povos para alcançarem a liberdade e libertar a região. Depois da morte de Samora, em 1986, já nos finais dos anos 1988 sugiram rumores de que o Governo da República Popular de Moçambique (RPM) havia dado “luz verde” aos religiosos para encetarem contactos com os agressores para o início de um processo de diálogo, o que foi imediatamente desmentido pelo então ministro da Justiça, Ossumane Ali Dauto. Mas em Julho de 1989 o Presidente Joaquim Chissano proferiu uma declaração que anunciava a existência de iniciativas de paz para o país e uma reunião marcada para ter lugar em Nairobi, no Quénia, com uma delegação de representantes de igrejas para auscultar as intenções da Renamo e criar-se condições para um diálogo directo, ao mesmo tempo que enunciava os princípios estabelecidos para o efeito. A LONGA CAMINHADA ATÉ À PAZ Para se chegar à assinatura do Acordo de Roma, hoje com 32 anos, um longo, sinuoso e espinhoso caminho foi percorrido. No dia 7 de Agosto de 1989 os dirigentes religiosos, chefiados pelo então arcebispo de Maputo, cardeal Dom Alexandre Maria dos Santos, reuniram-se em Nairobi com representantes da Renamo, num encontro dirigido pelo Presidente queniano, Daniel Arap Moi, com a participação do Presidente zimbabweano, Robert Mugabe. O Governo moçambicano propôs o dia 16 de Abril de 1990 para o início das conversações e a Renamo aceitou o Malawi como palco. Um encontro marcado para o dia 12 de Junho do mesmo ano viria a ser adiado por dificuldades criadas pela delegação da Renamo e do Quénia, mas o então ministro dos Transportes e Comunicações, Armando Guebuza, que chefiava uma delegação que integrava Pascoal Mocumbi, Rafael Maguni e Teodato Hunguana, reiterou a disposição do Governo para o diálogo. O primeiro encontro directo teve lugar na sede da Comunidade de Sant’Egídio, em Roma, de 8 a 10 de Julho de 1990, local que acolheu a segunda reunião, que aconteceu entre 11 e 14 de Agosto do mesmo ano. Em Setembro, a Renamo recusa-se a ir para a terceira ronda das conversações por alegadas ofensivas militares das tropas moçambicanas e zimbabweanas no campo de batalha. DE OBSERVADORES PARA MEDIADORES As negociações viriam a retomar em Novembro, tendo os observadores Mário Rafaelli, representante do Governo italiano, Andrea Riccardi D. Matteo Zuppi, da Comunidade de Sant’Egídio, e D. Jaime Gonçalves, arcebispo da Beira, passado a mediadores, por proposta da Renamo. No encontro de Dezembro, as partes alcançaram o primeiro entendimento sobre a concentração das tropas zimbabweanas para garantir a segurança e operacionalidade dos corredores da Beira e do Limpopo, assim como projectaram a assinatura do acordo de paz para 1991. Por diversas vezes este acordo foi violado e seguiram-se acusações mútuas que levaram a alguns impasses verificados na quarta ronda, em Roma, caracterizados por sabotagem à linha do Limpopo por parte da Renamo, levantando preocupação dos mediadores. Depois de vários adiamentos, as negociações retomam no dia 6 de Maio de 1991, com as partes e os mediadores optimistas, pois reinava um clima de confiança, mas não se chegou a acordo quanto à agenda porque a Renamo introduziu um ponto que não estava previsto, o que viria a ser ultrapassado a 28 de Maio, ao rubricarem o protocolo. A 1 de Agosto as duas delegações iniciavam a sétima ronda de negociações, tendo a lei dos partidos como um dos principais pontos, mas na sessão do dia 9 o Governo e a Renamo decidiram suspender as negociações para Setembro, mas que só viriam a retomar no dia 11 de Outubro. Foi necessário quase um ano de negociações de pormenor para se chegar ao consenso sobre determinados aspectos, como a assinatura do Protocolo 1 a 18 de Outubro de 1991. Os entendimento nas questões da constituição do exército único e apartidário, o calendário técnico de cessar-fogo, o futuro Serviço de Informação e Segurança do Estado (SISE) e o número de efectivos do futuro exército nacional unificado foram alcançados depois de muita discussão, que levou o Governo e a Renamo a rubricarem uma declaração de princípios para orientar operações de ajuda humanitária de emergência no país em socorro das vítimas da seca no dia 16 de Julho de 1992. O encontro directo entre o Presidente Chissano e Afonso Dhlakama teve lugar em Nairobi, Quénia, no dia 18 de Setembro de 1992. O Presidente Chissano anuncia depois que o Governo propôs Roma para assinatura do AGP, o que viria a acontecer no dia 4 de Outubro de 1992, passam hoje 32 anos. Por isso, para os moçambicanos, esta data está carregada de muito simbolismo e deve servir para resgatar o espírito de amor pelo próximo e reconciliação para uma convivência pacífica, sobretudo neste momento em que o país está a construir e consolidar a democracia multipartidária. O percurso desta caminhada está documentado nos arquivos do jornal “Notícias”, de forma detalhada, com materiais que podem ser consultados para qualquer pesquisa sobre o Acordo Geral de Paz para Moçambique. 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