Atanásio Zandamela
ERAM 7.57 horas de uma segunda-feira e o nosso destino era o distrito de Chókwè, para mais uma missão. A velocidade (de 60 ou 80km) indicada pelos sinais de trânsito teve de ser reduzida na localidade de Chaimite, distrito do Chibuto, para permitir que o rebanho comandado por um jovem pastor pudesse atravessar a estrada.
Minto, pois não se pode falar de jovem pastor, mas de pequeno pastor.
O pequeno pastor com um cajado na mão e uma pequena mochila contendo água – não livros – procurava comandar cerca de três dezenas de bois.
Mesmo vendo carros parados por conta da travessia do rebanho, que comanda, o pequeno pastor manteve tranquilidade e com auxílio do cajado, na mão, ordena que os animais imprimam velocidade. É imediatamente obedecido pelo gado que se dirige a um ponto em que se vê pasto.
Mesmo depois de verificar que os carros que estavam à nossa frente avançaram, nós decidimos parar… Paramos para ver e saudar o pequeno pastor.
Paramos, acima de tudo, porque Nwadjahane quis conhecer o petiz que representa tantos jovens pastores que tiveram de interromper os seus sonhos por conta das dificuldades da vida.
Após cumprir a marcha o pequeno pastor pôde sorrir e relaxar. Foi nesse momento que Nwadjahane se aproximou do rapazinho.
Saudou o pequeno pastor na língua de Luís de Camões, mas cedo percebeu que o melhor seria uma salada linguística (xironga e xichangana). E apresenta o que foi possível extrair dos três minutos com o pequeno pastor.
Nwadjahane (N) – Como é?
O pequeno pastor respondeu com gesto afirmativo… afinal os sinais também falam.
Insistimos um pouco…
N – Estás bem?
Pequeno Pastor (PP) – Sim.
N – Como te chamas?
PP – Porquê…?
N – Só quero saber… mas se não quer dizer não há problemas. Hoje não vai à escola?
PP – Já não estudo.
N – Este gado é da família?
PP – Não. Estou a trabalhar. É do tio… (parou por aí)
N – Tens quantos anos?
PP – Nove (não pronunciou apenas levantou dedos).
N – Seus pais…
PP – Não sei. Minha avó disse que meu pai foi à África do Sul trabalhar para fugir da gravidez da minha mãe, esta que me deixou com minha avó e foi ao lar. Não sei nada deles. Só quero trabalhar e voltarei à casa da minha avó quando tiver três bois (um macho e duas fêmeas)…
N – Não tens saudades da sua avó?
PP – Ela sabe que estou a trabalhar. Não falo, nem vejo ela, desde que vocês começaram a usar máscara. Lembra-se?
Foi quando começou aquela doença na China. Tive de sair porque tinha muita fome…
N – Aqui não tem problema de fome?
PP – Não! Até há dias que comemos carne…
N – Quanto recebes?
PP – Eu não quero salário agora. Eu disse ao tio que quero três animais quando completar 12 anos. Agora só me dá dinheiro para comprar bolachas, quando tenho vontade…
N – Gosta do seu trabalho…
O pequeno pastor fixa seu olhar em mim e ao mesmo tempo ordena para que os animais iniciem a marcha, pelo menos foi o que entendi…
PP – (risos)… Mas você, tio, está a perguntar-me muito porquê?
N – Só queria saber…
PP -Já falei muito. Não quero atrasar meu trabalho…
E de forma repentina a conversa de Nwadjahane com o pequeno pastor terminou, sem ter sabido sequer o nome dele.
Nwadjahane espera um dia cruzar o caminho do jovem e tem esperança de encontrá-lo feliz por estar a realizar o seu sonho de regressar às origens – não nos disse onde – com três bois (um macho e duas fêmeas). Isso se o tio do pequeno pastor cumprir a palavra…