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Terça-feira, 26 - Março, 2024

NWADJAHANE: O sonho do pequeno pastor

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Atanásio Zandamela

ERAM 7.57 horas de uma segunda-feira e o nosso destino era o distrito de Chókwè, para mais uma missão. A velocidade (de 60 ou 80km) indicada pelos sinais de trânsito teve de ser reduzida na localidade de Chaimite, distrito do Chibuto, para permitir que o rebanho comandado por um jovem pastor pudesse atravessar a estrada.

Minto, pois não se pode falar de jovem pastor, mas de pequeno pastor.

O pequeno pastor com um cajado na mão e uma pequena mochila contendo água – não livros – procurava comandar cerca de três dezenas de bois.

Mesmo vendo carros parados por conta da travessia do rebanho, que comanda, o pequeno pastor manteve tranquilidade e com auxílio do cajado, na mão, ordena que os animais imprimam velocidade. É imediatamente obedecido pelo gado que se dirige a um ponto em que se vê pasto.

Mesmo depois de verificar que os carros que estavam à nossa frente avançaram, nós decidimos parar… Paramos para ver e saudar o pequeno pastor.

Paramos, acima de tudo, porque Nwadjahane quis conhecer o petiz que representa tantos jovens pastores que tiveram de interromper os seus sonhos por conta das dificuldades da vida.

Após cumprir a marcha o pequeno pastor pôde sorrir e relaxar. Foi nesse momento que Nwadjahane se aproximou do rapazinho.

Saudou o pequeno pastor na língua de Luís de Camões, mas cedo percebeu que o melhor seria uma salada linguística (xironga e xichangana). E apresenta o que foi possível extrair dos três minutos com o pequeno pastor.

Nwadjahane (N)  –   Como é?

O pequeno pastor respondeu com gesto afirmativo… afinal os sinais também falam.

Insistimos um pouco…

N – Estás bem?

Pequeno Pastor (PP) – Sim.

N  –  Como te chamas?

PP – Porquê…?

N – Só quero saber… mas se não quer dizer não há problemas. Hoje não vai à escola?

PP  – Já não estudo.

N  –  Este gado é da família?

PP  – Não. Estou a trabalhar. É do tio… (parou por aí)

N  –  Tens quantos anos?

PP  – Nove (não pronunciou apenas levantou dedos).

N – Seus pais…

PP –  Não sei. Minha avó disse que meu pai foi à África do Sul trabalhar para fugir da gravidez da minha mãe, esta que me deixou com minha avó e foi ao lar. Não sei nada deles. Só quero trabalhar e voltarei à casa da minha avó quando tiver três bois (um macho e duas fêmeas)…

N  –  Não tens saudades da sua avó?

PP  –  Ela sabe que estou a trabalhar. Não falo, nem vejo ela, desde que vocês começaram a usar máscara. Lembra-se?

Foi quando começou aquela doença na China. Tive de sair porque tinha muita fome…

N  –  Aqui não tem problema de fome?

PP  –  Não! Até há dias que comemos carne…

N  –  Quanto recebes?

PP  – Eu não quero salário agora. Eu disse ao tio que quero três animais quando completar 12 anos. Agora só me dá dinheiro para comprar bolachas, quando tenho vontade…

N  –   Gosta do seu trabalho…

O pequeno pastor fixa seu olhar em mim e ao mesmo tempo ordena para que os animais iniciem a marcha, pelo menos foi o que entendi…

PP – (risos)… Mas você, tio, está a perguntar-me muito porquê?

N  –   Só queria saber…

PP -Já falei muito. Não quero atrasar meu trabalho…

E de forma repentina a conversa de Nwadjahane com o pequeno pastor terminou, sem ter sabido sequer o nome dele.

Nwadjahane espera um dia cruzar o caminho do jovem e tem esperança de encontrá-lo feliz por estar a realizar o seu sonho de regressar às origens – não nos disse onde – com três bois (um macho e duas fêmeas). Isso se o tio do pequeno pastor cumprir a palavra…

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